Publicado por Redação em Nacional - 27/09/2023 às 09:58:13

Palavra Episcopal

LIÇÕES DA IGREJA PERSEGUIDA PARA NÓS

Leia Filipenses 4.10-14 para me acompanhar nesta reflexão. Em Filipos se converteram, a partir de Paulo e seus amigos, três pessoas marcantes: Lídia, a comerciante; uma jovem possessa e o carcereiro. Pessoas de origens, classes sociais e experiências de vida muito distintas. Esses três relatos nos dão uma dimensão da vitalidade e da diversidade daquela comunidade.

Paulo lhes escreve quando preso em Roma. Ele afirma não ter recebido mais ajuda daquela igreja porque faltou oportunidade. A gratidão de Paulo e a frase “fizeste bem, associando-vos na minha tribulação” me inspiram a refletir sobre a igreja perseguida. Temos a tendência a sentir-nos condoídos com seus sofrimentos, a sentir pena de suas limitações. Mas essas igrejas podem nos motivar e não apenas ser motivos das nossas orações, como Paulo era para os filipenses.

 

Aprendi a viver contente

Jim Youst, pastor americano radicado na Indonésia, falou, em 2019, no Congresso da Igreja em Células, sobre os cristãos no Afeganistão. Era noite, em local escondido, quando ele os visitou. Ele pediu para interceder pelos irmãos. O líder da igreja lhe disse: Por favor, não ore para que a perseguição acabe! Yost ficou muito espantado e perguntou: Por quê? O homem ouvira dizer que os cristãos no ocidente eram frágeis e, muitas vezes, indolentes. Ele tinha receio de enfraquecer na fé se não fosse perseguido!

Certa vez, extremistas muçulmanos assassinaram cristãos no Egito, ao vivo, na televisão. E o irmão de um dos mortos declarou, em entrevista: “Ficamos felizes porque os assassinos não tiraram o áudio enquanto cortaram a garganta do meu irmão. E pudemos vê-lo afirmar que Jesus Cristo é o Senhor antes de morrer”.

Essas falas aproximam para nós o ardor missionário da igreja primitiva, para quem realmente o viver era Cristo e o morrer era lucro. Precisamos olhar para o desprendimento desses irmãos e aprender com eles.

 

De tudo e em todas as circunstâncias, tenho experiência

A segunda lição é o valor da experiência. Eles não perdem uma oportunidade sequer de sentar, ouvir e aprender. Maurício Zágari, escritor e preletor cristão brasileiro, reuniu-se em locais escuros, sob forte comoção. Sendo estrangeiro, viu irmãos e irmãs ansiosos pela palavra, genuinamente gratos pelo seu esforço e empenhados em aprender.

Nenhuma oportunidade é desperdiçada. Paulo, condenado à morte, deseja livros e pergaminhos. Dietrich Bonhoeffer nos legou os escritos do cárcere. O antigo missionário irmão André dedicou sua vida a contrabandear Bíblias para esses países. Cada chance de proclamar o evangelho ou de aprender sobre ele é preciosa.

 

Tudo posso naquele que me fortalece

A terceira lição é a profunda dependência de Deus. Essas igrejas não entram em debates teológicos infindos sobre forma de batismo, sobre eleição ou predestinação, sobre posturas políticas. Sua dimensão de reino de Deus é intensa.

Durante a Segunda Guerra Mundial, cristãos católicos faziam tumulto nos campos de concentração para que os pastores protestantes simulassem a santa ceia para seus membros. Protestantes morreram por esconder judeus, negros e deficientes em suas casas, como a família de Corrie Ten Boom. Isso acontece até hoje nesses países.

Essas igrejas nos apontam a centralidade da dependência de Cristo. Tudo se relativiza diante do absoluto que é Ele. Os laços da fé seguram as crianças abandonadas, órfãs e as viúvas, quando maridos e pais são assassinados. Há uma responsabilidade coletiva, uma preocupação diaconal com a mesa, como no livro de Atos.

 

Todavia, fizeste bem, associando-vos na minha tribulação

O vigor evangelístico da igreja perseguida nos constrange. O missionário metodista Kingspride, que atua em Gana, fala dos riscos de morte que vivencia ao pregar o evangelho a muçulmanos xiitas. Ele destaca a necessidade do amor verdadeiro para esta pregação.

Carlinhos Senegal, missionário metodista brasileiro, me contou que, no Ramadã, muitos muçulmanos sonham com Jesus. Quando chegou numa aldeia, certa vez, um jovem o procurou. Um anjo lhe ordenara a buscar o missionário e pedir o livro (Bíblia).

Irineu, pai da igreja, falava que “sangue de mártir é semente”. Surpreendentemente, há milhares de cristãos nesses países. A igreja, em meio à perseguição, ama o perdido e se arrisca por ele.

 

O desafio

Devemos orar, sim, para que todos louvem e sigam a Deus em liberdade. Mas não achemos que somente situações pacíficas geram uma igreja forte. Essas igrejas nos demonstram, na prática, que nossa teoria é uma furada. Que eles nos inspirem a viver profundamente a nossa fé! Oremos pelas igrejas que sofrem perseguição religiosa. Oremos pelas igrejas abençoadas com a liberdade religiosa. Que nessas duas condições, haja uma igreja viva, vibrante e fiel.

 

 

Bispa Hideide Brito Torres

Presidente da 8ª Região Eclesiástica


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