Publicado por Redação em Notícias, Reflexão - 04/05/2018 às 14:40:49

Da Festa das Semanas ao Pentecostes

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As instituições bíblicas, sejam elas religiosas, instruções legais ou celebrações festivas, possuem uma origem, bem como uma razão de ser. Pesquisadores/as denominam esse fenômeno de etiologia, isto é, o estudo das causas. Particularmente, dedicaremos alguns momentos para pesquisar uma das celebrações mais comentadas, mas pouco estudadas pela Igreja Cristã: o Pentecostes.

Origem da Festa de Pentecostes

Primeiramente o nome “Pentecostes” não é original nem pertence à língua hebraica, na qual o Antigo Testamento foi escrito. O nome “Pentecostes” surgiu durante a dominação da Grécia (333-63 a.C.). Parte dos/as judeus/as que falavam o idioma grego passou a chamar a festa de shavuot (Semanas) de Pentecostes, cujo significado é “quinquagésimo dia”.

Há uma razão para isso. No calendário de festa do povo bíblico, a festa de shavuot ocorria exatamente 50 dias após a celebração da Páscoa. Primitivamente, shavuot não era o único nome para a festa. Alguns grupos israelitas deram outros dois nomes para a festa de shavuot; popularmente ela também era conhecida como qasir (Colheita) e yom habicurim (Dia dos Primeiros Frutos ou Primícias).

Esses quatro nomes atribuídos à Festa carregam uma razão de ser. Aliás, no Antigo Testamento, o nome expressa a realidade do ser que carrega. Dessa forma, o nome shavuot tem sua razão de ser por estender-se por sete semanas após a Festa da Páscoa; o nome grego “Pentecostes” é porque a festa é celebrada 50 dias após a Páscoa; a denominação qasir (Colheita) é porque a festa acontecia anualmente durante a colheita de cevada e trigo; e, por fim, yom habicurim (Dia dos Primeiros Frutos ou Primícias), porque uma das partes da festa constituía-se da apresentação dos primeiros frutos e melhores frutos daquela colheita. Provavelmente, o nome “Semanas” foi o mais popular entre os escritores bíblicos; porém, “Colheita” foi o mais antigo, pois basicamente essa festa tinha como tema a sega de cereais.

Objeto da celebração

O povo bíblico soube valorizar sua história, mas o motivo desse interesse não estava no sentimentalismo ou na autovalorização de seus feitos ou de seus/as heróis/as. Há nesse gesto um objetivo pedagógico: primeiro sinalizar às gerações que Deus é criador e está presente no mundo criado por Ele, através de seus atos salvíficos; segundo, ao povo cabe a tarefa de agradecer a Deus e planejar em comunidade. Ao longo dos séculos o povo bíblico reunia-se para prestar culto a Deus com dois motivos em mente.

Primeiro, Israel celebrava a abundante colheita do trigo e cevada, entre outros cereais, produzidos nos seus campos. A geografia do Antigo Oriente Médio pode explicar os motivos da alegria dos/as idealizadores/as dessa festa. É que boa parte da terra de Israel é cercada por extensos desertos. Além disso, em algumas regiões, o solo é bastante pedregoso (conferir Is 5.1-7).
Qualquer desastre climático pode provocar fome entre o povo. Portanto, a boa colheita significa explosão de alegria, e, entre o povo crente, motivo de gratidão a Deus pela doação da terra. Como a terra é um bem comum (cf Lv 25.23), a festa era aberta a todos/as os/as trabalhadores/as, sejam judeus/as, escravos/as ou gentios/as.

Segundo, o povo bíblico encontrou mais motivos para agradecer a Deus durante a celebração da Festa das Semanas. Ele entendeu que a gratidão a Deus pelos cereais colhidos naquela safra poderia ser estendida aos mandamentos divinos, cuja presença constante, concreta e silenciosa, entre o povo trabalhador era a garantia de vida plena para a comunidade e para a natureza.

Em dado momento da história, provavelmente a partir do século V antes de Cristo, o estudo da Torá (os cinco primeiros livros da Bíblia) tornou-se tarefa básica dos/as celebrantes (leia-se em Ne 8-9). Provavelmente o Salmo 19 foi composto e cantado nesse ambiente. Suas palavras assim sugerem: “A Torá de Javé é perfeita, restaura a vida (…) dá sabedoria aos simples (…) alegra o coração (…) ilumina os olhos (…) permanece para sempre (…) todos igualmente justos” (Sl 19.7-9). O Salmo 119 também é produto desse forte sentimento de gratidão pelas normas e estatutos concedidos por Deus.

A Festa da Igreja Primitiva

A Igreja Cristã, de modo geral, fala do Pentecostes como tema distante da celebração do Antigo Testamento, embora a reportagem de Atos 2.1-13 não justifique tal procedimento. Diante disso, seria saudável e importante que as comunidades cristãs analisassem a tradição dessa festa dentro da Bíblia.

Quanto ao nome, a Igreja Cristã adotou o nome “Pentecostes”. Os/as judeus/as, desde meados do século III antes de Cristo, já tinham substituído o nome Semanas/Colheita por Pentecostes.
O Relato de Atos dos Apóstolos 2.9-11 mostra que a festa acolhia pessoas de todas as raças, lugares e condições sociais, como prescrevia a Torá (Lv 23.22).

Tomando novamente a narrativa de Atos dos Apóstolos, evidencia-se o evento da ação do Espírito Santo sobre os/as celebrantes (v2-4). Aparentemente, esse é o ponto de divergência com o ritual do Pentecostes no Antigo Testamento, entretanto, se pensar bem, não há divergência no eixo estrutural. A leitura e o estudo da Torá eram vistos pelo salmista (19.7-10) como presença do próprio Deus realizando milagres: “restaurando vida”, “dando sabedoria aos símplices”, “alegrando o coração”, “iluminando os olhos” (…).

Concluindo

Primeiro, torna-se necessário para o/a cristão/ã um estudo mais aprofundado da Bíblia como um todo, para evitar desvios de interpretação, já que a Igreja Cristã aceitou o Antigo Testamento como Palavra de Deus. Reinterpretar e ressignificar textos que contêm afirmações ou práticas são caminhos normais tomados pelos profetas, legisladores, entre outros. Como exemplo, Jeremias reinterpretou a Aliança estabelecida no Sinai (Ex 19.1; 20.21 e Jr 31.31-34). Da mesma forma, Jesus não substituiu a Torá, mas reinterpretou-a (Mt 5.17).

Segundo, é possível perceber que a celebração de Pentecostes pela Igreja de hoje está um tanto distante do ritual bíblico. As igrejas em suas celebrações têm lembrado de:

- Agradecer pela terra e seus frutos?
- Enfatizar o aspecto comunitário?
- Destacar um momento para ouvir as insinuações da Palavra de Deus que ilumina e dá sabedoria aos/às que buscam orientação e força?

Enfim, uma simples análise da prática das igrejas referente ao Pentecostes vai encontrar costumes e doutrinas que, muitas vezes, ferem o texto bíblico; na prática, a posse do Espírito Santo é disputada por indivíduos, de maneira competitiva, pois esse dom é tomado como um instrumento particular para engordar a vaidade e a volúpia do lucro. Portanto, é hora de buscar o primeiro amor, isto é, as marcas do Pentecostes Bíblico. 

Dr. Tércio Machado Siqueira
Pastor metodista aposentado e ex-professor da Fateo

Publicado originalmente no Jornal Expositor Cristão de maio de 2018


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